Texto: Professor Miguel João Simão
Escritor e Pesquisador.
Dona Ica, assim é conhecida Rosa de Melo Grapp, nativa das terras de Ganchos, onde nasceu no dia 29 de janeiro de 1932.
Filha do pescador e pombeiro, Joaquim Pinto de Melo Filho e de dona Maria Francisca de Melo, a pequena Ica, dividia o espaço em casa com os irmãos: Valdevino, Dalmor, Maria Catarina, Dalva e Anita, todos com muita saúde e sob os cuidados dos pais.
Cedo, dona Rosa, teve que trabalhar nas salgas escalando peixes, para ajudar no sustento da família, pois o pai, ganhava pouco na pescaria.
Estudou em Ganchos até o 4º ano, passando pelas mãos das professoras Princesa e Olindina, que ela lembra até hoje.
Ica, lembra muito das festas religiosas na igreja, e de algumas domingueiras que a aconteciam casa do Zé Sagás, mas de bailes a noite, nunca foi, pois, o pai era muito rígido.
Muito cedo, conheceu Benoni, um gancheiro que era doidinho por ela. Em virtude da pouca idade, os pais não deixavam eles se encontrarem.
Um dia, Benoni, rapaz meio atrevido, resolveu chegar perto de Ica, e lhe roubar um beijo, o que deu pano para as mangas. Dona ica comentou: “ Rapaz, eu tava sentado perto da porta da casa e ele (Benoni), passou por trás e me deu um beijo. Eu gritei, ele saiu correndo, ai me apavorei, porque pensei, no meu entendimento, que ele tinha feito mal pra mim. Comecei a chorar, a mãe perguntava e eu não falava, daí o rosto ficou vermelho, e eu já achava que era do beijo, quase me acabei. Depois de uns três dias, ele mandou a Nilza, filha do seu Anastácio me entregar uma carta. Na carta, ele falava que já que tinha roubado o beijo, e que era apaixonado por mim, pediu pra mim esperar, porque ele tava indo pro Rio Grande trabalhar no camarão, conseguir uns trocados e vir casar comigo”
Foi assim que começou o namoro de Ica e Benoni, que retornou a Ganchos, após algum tempo fora, e oficializaram o casamento no dia 15 de abril de 1950, na presença do juiz de Paz, Manoel Honório dos Santos, tendo por padrinhos: Dalmor Pinto de Melo e Osmandina da Conceição de Melo, e João Ancelmo dos Santos e Maria Francisca dos Santos.
Benoni, retornou ao Rio Grande do Sul para trabalhar, mas como ganhava pouco, Ica não ficava aparada, ia à luta trabalhar nas salgas para ajudar no sustento dos filhos, ao todo 9: Rosete, Rosélia, Benoni Grapp Filho, Rosa, Blademir, Blandino, Marcelo, Luciano e Belarmino.
Com a construção do Grupo Escolar Dr. Aderbal Ramos da Silva, Benoni consegue um emprego de servente, onde trabalhou alguns anos e depois foi trabalhar no Estreito, mudando com a família para lá.
Dona Ica, depois de ter os filhos criados buscou conhecimento na área da saúde, estudando e se tronando Técnica em Enfermagem, trabalhando por muitos anos na Maternidade Carmélia Dutra, até se remover para o posto de saúde de Ganchos, trazida pelo ex – prefeito Samuel Silva, a quem, muito deve esse favor, segundo ela.
História da Benzedeira Ica
A história das benzeduras de Ica, aconteceu de forma inesperada em sua vida, visto não ter sido treinada para essa função, o que ela chama de missão dada pela tia.
Rosa de Melo Grapp, sempre acompanhou a tia do esposo quando essa ia benzer as pessoas, mas nunca prestou atenção nas benzeduras, ia como companhia.
Mas um dia, logo depois da morte da tia, Ica começou a sonhar com a velha benzedeira e inclusive começou a ouvi-la.
A falecida, sempre lhe pedia a mesma coisa, para que ela continuasse sua missão de ajudar as pessoas, benzendo. Ica ficava apavorada e dizia: - como vou benzer alguém, senhora? Nunca benzi ninguém, nei sei por onde começar.
Até que um dia, a tia paarece novamente a ela e ordena, que ela começasse logo, e que na manhã seguinte iria aparecer um homem com uma criança nos braços para ela benzer.
Ica ficou em desepero, e não era para tanto, pois a responsabilidade é grande, tratando-se da fé dos outros, ela comentou.
Na manhã seguinye, Ica foi acordada pelos chamados de um homem, e quando ela foi ver de quem se tratava, percebeu que era Alcindino, filho da falecida, que trazia em seus braços sua pequena filha para que ela benzesse.
Ica, questionou o primo, pois nunca benzeu ninguém. Alcindino, disse que a mãe dele, veio em sonho e mandou ele levar a menina na casa de Ica, pois a menina estava com quebranto e mau olhado, e ela ia ajudar.
Ica que já sabia da história, pediu para ele pegar uma folha de laranjeira, e do nada a reza começou a sair. “ Vinha tudo na minha cabeça, sem eu nem saber como.
Depois de benzer a menina pediu comida, pois faziam três dias que ela não comia nada.
Desta data em diante, as conversas foram se arrastando pelos quatro cantos de Ganchos e hoje, dona Ica não para de atender mesmo aos 91 anos de idade.
Passos curtos, ajudado por um andador, a mulher com mais de 9 décadas, senta no sofá, puxa um crucifixo, e com uma memória invejável, dar-se em benzer. Seja de quebranto, arca caída, nervo torto, de dor de dente e por aí vai, dona ica puxa as rezas que acalma corações e diminui aflições.
Hoje, reside em Calheiros, contando com o apoio dos 9 filhos que se orgulham da velha guerreira que sempre foi uma lutadora.